#269 – Saccharomyces cerevisiae var. diastaticus: amiga ou inimiga?

Introdução

A levedura é um dos pilares fundamentais da produção cervejeira, e, nesse universo, a Saccharomyces cerevisiae var. diastaticus gera fascínio e desafios.

Com a parceria da Lamas Brewshop, da Hops Company, da Levteck e da Cerveja Stannis, neste episódio do Brassagem Forte, Henrique Boaventura conversa com Gabriela Müller, diretora técnica da própria Levteck, sobre o impacto dessa levedura na fermentação, sua biologia e aplicações.

O trabalho da Levteck com leveduras

A Levteck Tecnologia Viva se destaca por sua produção de fermento líquido e kits de controle microbiológico. A empresa investe na pesquisa e no isolamento de novas leveduras, incluindo aquelas obtidas no projeto Manipuera. Além disso, ela permite que cervejeiros caseiros testem novas linhagens e compartilhem seus resultados, promovendo a inovação no setor.

O que é a Saccharomyces cerevisiae var. diastaticus?

A Saccharomyces cerevisiae var. diastaticus já foi considerada um problema para a produção cervejeira devido à sua capacidade de consumir carboidratos complexos, prolongando a fermentação e causando supercarbonatação. Contudo, quando bem manejada, essa levedura pode ser uma grande aliada na produção de estilos específicos.

O papel dos genes STA

O diferencial dessa levedura está no conjunto de genes STA (STA1, STA2 e STA3), responsáveis pela produção da enzima glicoamilase. Essa enzima degrada carboidratos complexos em açúcares menores, permitindo que a levedura continue fermentando além do esperado. Assim, tal característica é essencial para cervejas de alta atenuação.

Descoberta e classificação taxonômica

Descoberta em 1943, a Saccharomyces diastaticus foi inicialmente classificada como uma espécie distinta. Mas, com o avanço das técnicas de biologia molecular, pesquisadores perceberam que suas diferenças genéticas em relação à Saccharomyces cerevisiae eram mínimas. De modo que, em 2009, ela foi reclassificada como uma variedade da mesma espécie.

Como a diastaticus impacta a fermentação?

A principal característica dessa levedura é sua fermentação prolongada. Inicialmente, ela consome os açúcares simples, mas depois entra em uma fase em que secreta a citada glicoamilase para degradar carboidratos mais complexos. Esse processo pode levar dias adicionais, impactando diretamente a atenuação da cerveja.

Identificação e controle da diastaticus

⏳ Historicamente, a detecção dessa levedura era feita por observação microscópica e pelo comportamento fermentativo anômalo. Hoje, métodos moleculares permitem identificar a presença dos genes STA com alta precisão.

Problemas potenciais na produção cervejeira

A presença não-intencional da diastaticus pode causar problemas como:

  • Supercarbonatação: a fermentação prolongada pode resultar em garrafas ou latas explosivas.
  • Alterações sensoriais: a diastaticus pode produzir compostos fenólicos indesejáveis, como notas de cravo ou borracha.
  • Contaminação cruzada: falhas na limpeza podem espalhar essa levedura para outras produções.

Aplicações positivas da diastaticus

Apesar desses desafios, a diastaticus tem um grande potencial na produção cervejeira e industrial.

  • É usada em estilos de cerveja específicos, como Farmhouse Ales, Saisons e Tripels, nas quais a atenuação elevada é desejada.
  • Utilizada na produção de bebidas com baixo teor de carboidratos, graças à sua capacidade de degradação de açúcares complexos.
  • E também é mobilizada pela indústria de etanol, em processos que envolvem substratos amiláceos, como o milho, nos quais a sua capacidade de fermentação contínua é altamente valorizada.

Estratégias de inoculação e fermentação

A forma como essa levedura é introduzida no processo faz toda a diferença no resultado final. Assim, são duas as abordagens mais comuns:

  1. Inoculação simultânea: ambas as cepas mobilizadas na produção são adicionadas juntas, criando um equilíbrio entre ésteres e atenuação.
  2. Inoculação sequencial: uma levedura primária realiza a maior parte da fermentação antes da diastaticus ser introduzida para “secar” a cerveja.

Boas práticas de limpeza e controle microbiológico

A diastaticus não forma biofilmes robustos como a Brettanomyces, tornando-a mais fácil de eliminar com boas práticas de sanitização. No entanto, falhas na limpeza podem levar à contaminação cruzada e fermentações indesejadas. Portanto, algumas medidas são necessárias e, entre as essenciais, é possível citar:

➡ Uso de produtos sanitizantes eficazes.
➡ Verificações microbiológicas regulares.
➡ Manutenção rigorosa de equipamentos de envase e fermentação.

Conclusão

A Saccharomyces cerevisiae var. diastaticus pode ser uma vilã ou uma grande aliada na produção cervejeira. O segredo está no controle e no conhecimento técnico para aproveitar seu potencial sem comprometer a qualidade da cerveja. De modo que o seu uso planejado pode resultar em cervejas mais secas, complexas e diferenciadas, enquanto sua presença não intencional pode gerar grandes desafios e problemas.

Se você quer entender ainda mais sobre essa levedura e como utilizá-la com segurança, confira este artigo detalhado da Levteck Tecnologia Viva.

Conhecia essa variedade de levedura? Já a utilizou, ou enfrentou problemas com ela nas suas próprias experiências cervejeiras? Conte mais aqui nos comentários!

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